Faltou coragem.
Confusão na cidade. A Câmara
Municipal de São Francisco do Sul irá votar projeto no qual ficará claro o lado
que cada um dos edis está se posicionando. Situação ou oposição.
( Câmara dos Vereadores de São Francisco do Sul )
O projeto é de grande
interesse para a comunidade local. Pode prejudicar a qualidade de vida dos munícipes
e trazer vantagens para empresas que pretendem se instalar no município.
Trata-se de discussão complexa e interessante. A cidade está se movimento
contra ou a favor.
O presidente da Câmara
anuncia que irá instalar um telão na fachada do prédio para que os populares
que não consigam entrar no recinto próprio possam saber quem é quem. Um telão para que a população
acompanhe a votação.
A cidade está dividida.
À noite Lourenço vai até a
Camara mas não consegue ingressar. Fica nas redondezas. Muita gente apreciando
o movimento e aguardando a sessão ter inicio.
Na parede do prédio, no alto,
um telão que irá tornar público o voto e as manifestações dos vereadores.
A situação é nervosa.
Claramente nervosa. Gente exaltada se manifestam na rua, ora querendo entrar,
ora contra, ora à favor. A Policia Militar está nas imediações.
(...)
O tempo passa a sessão não se
inicia.
Um oficial de justiça chega e
pede para ingressar no recinto.
Multidão também quer
ingressar. No entanto, os lugares já estão tomados e ninguém mais entra. Nem
tem senha para o povo.
O Oficial de Justiça insiste.
O presidente da Camara dos Vereadores fica ciente que será citado em ação cautelar e intimado de liminar concedida pelo Magistrado que determina seja suspenso o telão.
O presidente se desespera. O prefeito tem interesse na
aprovação do projeto. O presidente seu adversário não.
O advogado da Camara não sabe como
proceder e sugere o nome de Lourenço para orientar. Resolver. Dar a solução...
O presidente concorda. Mesmo sendo adversário político, sabe que Lourenço também é
adversário do Prefeito e poderá ajudá-lo a solucionar e evitar que a liminar
seja comprida.
A porta se abre.
O procurador da Camara dos
Vereadores procura por Lourenço na multidão.
- Dr. Lourenço, o presidente gostaria
de falar contigo. Você pode ingressar e atende-lo?
(...)
O plenário está vazio, porém
o auditório, a plateia e a galeria
superlotadas de cidadãos de todas as facções políticas partidárias de São
Francisco do Sul.
Minutos depois está numa sala
reservada aguardando que o presidente apareça e apresente suas intenções.
- Pois é dr. Lourenço, o
oficial está na porta, lá fora, querendo entrar para me citar, me intimar... Proibindo
a exibição do telão. Eu quero exibir a sessão para todos... O que eu faço?
Lourenço escuta com atenção e
de forma bem clara, objetiva e simples preleciona.
- Presidente você é o chefe do
Poder Legislativo Municipal. Aqui nesse recinto você manda. Entre e sai quem
você quiser. Você detém o poder de polícia... ( patati patata... bla, blá, bla
)... ...
O presidente e o assessor
jurídico escutam a fala esclarecedora.
-... Portanto, basta você dar
inicio à sessão e ignorar a presença do oficial. Quando tudo terminar, aí você o
deixa entrar, peça desculpas, em razão da confusão... De uma desculpa qualquer.
( ... )
Lourenço esclarece com
detalhes. E assevera.
- Não precisa temer. Você
manda. Você é o Poder Legislativo e manda nesse prédio. Inclusive o Judiciário,
o Executivo, o Juiz tem que te respeitar. Se faça respeitar. Se imponha.
Lourenço pensa: precisa ter
coragem e agir. Mas não irá agir. Não tem peito. Vai se curvar.
E como previsto, o presidente não
enfrenta, abre a porta, é citado da ação e intimado da liminar.
O telão é recolhido. O povo vaia.
Essa história, como outras, revelam bem a personalidade do povo da ilha.
Noutra ocasião, anos antes,
Lourenço era assessor jurídico da Camara Municipal da Estância Balneária de
Itanhaém, reconhecidamente a Camara de Vereadores mais antiga do pais.
O prefeito municipal não
repassava o duodécimo previsto no orçamento para forçar os vereadores se
curvarem aos seus desejos...
Certa manhã, Dr. Ávila,
o presidente chama Lourenço e explica
que está sendo pressionado pelos vereadores e que precisa fazer algo e resolveu
notificar, impondo-lhe pena ... Preciso pagar os vereadores insiste o presidente.
- Não. Não faça desse modo.
Imponha-se. Você é o Poder Legislativo. Você manda e tem que ser respeitado.
Notificar por cartório estará requerendo favor e tolerância do Poder Judiciário
a quem o cartório é submetido. ( blá blá blá
- Quem requer, está deixando ao arbítrio do titular do poder deferir ou não, prossegue Lourenço, explicando que não deveria ir ao cartório de títulos e documentos notificar.
- Quem requer, está deixando ao arbítrio do titular do poder deferir ou não, prossegue Lourenço, explicando que não deveria ir ao cartório de títulos e documentos notificar.
Após algumas ponderações o
presidente aceitou as orientações. Foi elaborado pedido de intervenção
estadual, representação ao Ministério Público e comunicado o Prefeito que na
manhã seguinte seria avisado o Plenário e protocolado os pedidos, caso os
valores devidos não fossem depositados em meia hora.
( $$$$$ )
O dinheiro foi depositado.
Nunca mais houve atraso no repasse e o Poder Legislativo Municipal passou a ser
respeitado por Edson Baptista de Andrade, o burgo-mestre que andava descalço
pela cidade. O prefeito municipal que para ampliar sua gama de eleitores loteou
praças públicas do município entregando-as a pessoas desprovidas de recursos...
O prefeito municipal que impedia a construção de edifícios em condomínio para
não atrapalhar a venda de seus loteamentos na cidade...
Lourenço recorda-se de outra
passagem pitoresca que enfrentou na condição de assessor jurídico daquela Casa
Legislativa.
O prefeito através de decreto
municipal impôs a proibição de ônibus de turistas no centro da cidade,
desviando-os para a extremidade sul, no bairro onde ali vivia uma grande
comunidade que não aceitou a medida.
Era férias de verão. A cidade
lotada. Um sábado no entardecer. Sessão extraordinária da Camara, à época instalada
à avenida Rui Barbosa, de fronte ao parque de diversões, ao lado de um notário,
onde o plenário era no térreo e os gabinetes e administração na sobreloja.
Começa a chegar munícipes.
Gente. Gente. Muita gente vindo do bairro que agora recebia todos os ônibus que
chegavam ao município com turistas. Onibus de farofeiros, que não traziam
benefícios, apenas sujavam, faziam algazarras, fogueiras, provocavam moradores,
criavam transtornos e confusão.
Gente revoltada que sentaram
na plateia, acomodaram-se em pé e aguardaram a chegada dos vereadores. Muita
gente.
Meia hora após a designada
pela convocação, Dr. Àvila desce para dar inicio aos trabalhos. Pede que
Lourenço o acompanhe. Os demais vereadores preferem aguardar um tanto
mais.
Ao adentrar no salão começa a
vaia. Muita gente gritando e vaindo, jogando toda a insatisfação ao presidente
da Câmara, quando na verdade tratava-se de ato da adminstiração e o prefeito é
quem deveria ser o objeto dos ataques decorrentes da insatisfação.
Lourenço que acompanhava o
presidente também foi vaiado. Os vereadores assim que apareciam, atendendo a
campainha que era tocada avisando que a sessão iria começar, igualmente
vaiados. Ninguém era perdoado.
(...)
Com paciência e habilidade
após duas horas de tumulto, com a presença da Policia Militar para dar
segurança a todas as autoridades, os munícipes se retiraram, vaiando, xingando
e falando mal de todo mundo.
Anos depois, em Gurupi, Lourenço foi contratado para o cargo de Assessor Legislativo da Câmara de Vereadores local e posteriormente, assessor para elaboração da Lei Orgânica do Município.
Anos depois, em Gurupi, Lourenço foi contratado para o cargo de Assessor Legislativo da Câmara de Vereadores local e posteriormente, assessor para elaboração da Lei Orgânica do Município.
Roberto J. Pugliese
presidente
da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB-Sc
Consultor
da Comissão Nacional de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB.
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