06 janeiro 2014

O guarda da ponte. ( memória n º 55 )


Memória Nº 55.
A ponte velha.
 

Itanhaém é atravessada pelo sinuoso rio que leva o nome da cidade, dando através de suas curvas o charme envolvente que tem levado ao longo do tempo milhares de pessoas a retratarem por ângulos variados tanto encantamento. A partir de 1912, com a inauguração da Ferrovia que desde o porto de Santos segue para o Vale do Ribeira, o rio Itanhaém foi cortado por uma ponte, inicialmente exclusivamente ferroviária e posteriormente adaptada, transformada em rodoferroviária após o término da II guerra mundial.

 

A ponte passou a suportar um movimento de veículos intenso e constante, dispondo de um funcionário da ferrovia que cuidava das porteiras que eram fechadas para que as composições atravessassem, impedindo o fluxo de autos.

 

O guarda ficava numa guarita com comunicação telefônica direta com a estação  principal, situada na Vila, e igualmente com a outra estação, provavelmente em Peruíbe, que avisava ter o trem saído, mandando o funcionário fechar as porteiras. Dia e noite 24 horas... e sem piedade, a turma de garotos, que da Prainha iam à pé, para a Vila, somando ora 20, ora 30 ou 50 crianças, não poupavam e em coro gritavam repetidas vezes durante o trajeto:

 

- O guarda da ponte é viado... O guarda....

 

A tropa infanto juvenil atravessava os  500 metros de ponte cantando a ofensa ao inocente trabalhador que era obrigado a suportar a agressão moral... até que um dia, um deles, saiu atrás das crianças que corriam pelo corredor de pedestres, anexo ao leito rodoferroviário e deu alguns tiros para cima.

 

Nessa oportunidade Lourenço não estava. Mas noutra, quando descobriram que na Avenida do Mar, hoje Presidente Kennedy, havia um poste com um registro no qual, bastava desliga-lo e toda a iluminação pública da Prainha, Praia dos Sonhos e quem sabe Belas Artes e Cibratel se apagava... iniciaram as mesmas crianças a costumeiramente em horários distintos, ora as 20 h, ora as 22 h ou mesmo por volta das 17 h, de modo que não chegasse a acender, a prática do serviço de economia, poupando a Prefeitura Municipal de pagar as tarifas devidas a Usina Termoelétrica de Juquiá, que abastecia de energia elétrica todo o litoral sul.

 

Posteriormente, já esses jovens, meio adultos alguns, ainda crianças outros, passaram a ter seus automóveis ou emprestá-los dos pais, e  articulavam a interrupção da travessia da ponte. Engendravam tumultuar todo trânsito de veículos da cidade que se viam impedidos de cruzarem o rio em qualquer dos sentidos.

 

Uns seguiam da Vila em direção à Prainha e outros, fingindo não perceberem, seguiam em direção contrária se encontrando no meio da ponte, descendo e simulando discussão... Confusão geral. Buzinação e desespero do guarda da Cia. Sorocabana, dado o aviso da vinda do trem...

 

A confusão era tal que substituíram a porteira por guardas municipais e depois por semáforos... mas não eram obedecidas as instruções eletrônicas ou dos servidores públicos e se quer da Estrada de Ferro Sorocabana.

 

A situação caótica simulada só deixou de existir quando essa turma de jovens cresceu e foi construída nova ponte, deixando a velha, apenas para a Fepasa, então concessionária da ferrovia, usa-la com exclusividade.

 

História que vem a lembrança que se reporta a essa mesma época, é que numa determinada manhã, foi decidido que iriam para o Cibratel. Alguns jovens da turma: Trappé, Cleso, Aurélio, Nino, Eduardo e Lourenço. Iriam na perua C 14, pertencente ao Hotel Ca D’oro,que durante o período de férias ficava dando apoio aos proprietários.

 

O motorista os levariam até a praia e permaneceria por lá. Iriam se encontrar com outros jovens, jogar futebol, nadar por lá...Iriam encontrar uns jovens italianos amigos da família do Aurélio, apelidados por Trapatones, em homenagem ao jogador da seleção azurra.

 

O automóvel estava na garagem, nos fundos da casa, e todos já haviam entrado, menos Lourenço que ficou para abrir o portão, fecha-lo e seguir com os amigos. No entanto, o portão emperrou e Lourenço não conseguia abri-lo. Gritou, fez sinal, porém a perua não parou e, num lance de intuição, Lourenço de um salto, se esquivando do acidente, pois a perua atropelou o portão. Destruiu o portão de entrada da casa.

 

A bagunça no veículo era tanta que o motorista não escutou o aviso e também não percebeu que o portão permanecia fechado e foi com toda a velocidade que a marcha à ré permitia.

 

Lourenço se safou de um grande acidente cujas consequências seriam muito sérias.

 

Roberto J. Pugliese
www.pugliesegomes.com.br
 Membro da Academia Eldoradense de Letras
Membro da Academia Itanhaense de Letras
Titular da Cadeira nº 35 – Academia São José de Letras

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