17 fevereiro 2012

Ficha Limpa x Constituição Federal x Gilmar Mendes

Ficha Limpa - Ministro Gilmar Mendes fez defesa veemente dos princípios da
presunção de inocência e da irretroatividade da lei.

Nem mesmo a forte pressão da opinião pública, destacada pelo relator, ministro Luiz
Fux, justifica a relativização de princípios constitucionais.

"Não cabe a esta Corte fazer relativizações de princípios
constitucionais visando atender ao anseio popular. É preciso garantir e efetivar
tais princípios, fazendo valer sua força normativa vinculante, dando-lhes
aplicação direta e imediata, ainda que isso seja contra a opinião momentânea de
uma maioria popular. Certamente, a decisão desta Corte que aplica rigorosamente
a Constituição poderá desencadear um frutífero diálogo institucional
entre os poderes e um debate público participativo em torno dos temas nela
versados. A história nos demonstra que as decisões contra majoritárias das Cortes
Constitucionais cumprem esse importante papel, uma função que, em verdade, é
eminentemente democrática", afirmou.

Gilmar Mendes citou o ministro aposentado do Supremo, Moreira Alves, para
defender que a Lei Complementar 135/2010, nas hipóteses em que apanha fatos
passados para atribuir-lhes efeitos nos processos eleitorais futuros, viola o
princípio da irretroatividade da lei.

"Normalmente as leis dispõem para o
futuro, não olham para o passado. Em consequência, os atos anteriores à vigência
da lei nova, regulam-se não por ela, mas pela lei do tempo em que foram
praticados — tempus regit actum", disse Moreira Alves, citando José
Carlos de Matos Peixoto.

O ministro usou quase um terço das 47 páginas de seu voto para sustentar a
inconstitucionaldiadedo que dispositivo da lei que prevê a inelegibilidade por
condenação penal em segunda instância. Para ele, o dispositivo fere o princípio
da presunção de não culpabilidade.

Neste ponto, citou o voto de seu colega de corte, Celso de Mello no
julgamento da ADPF 144: "Torna-se importante assinalar que a presunção de
inocência, embora historicamente vinculada ao processo penal, também irradia os
seus efeitos, sempre em favor das pessoas, contra o abuso de poder e a
prepotência do Estado, projetando-os para esferas processuais não-criminais, em
ordem a impedir, dentre outras graves consequências no plano jurídico —
ressalvada a excepcionalidade de hipóteses previstas na própria Constituição —,
que se formulem, precipitadamente, contra qualquer cidadão, juízos morais
fundados em situações juridicamente ainda não definidas (e, por isso mesmo,
essencialmente instáveis) ou, então, que se imponham, ao réu, restrições a seus
direitos, não obstante inexistente condenação judicial transitada em
julgado."

Gilmar criticou a afirmação do relator, ministro Luis Fux, de que o
Supremo deveria realinha sua interpretação da presunção de inocência, ao menos
em termos de Direito Eleitoral, com o estado espiritual do povo brasileiro.
"Sobre essa afirmação, gostaria de fazer recordar, mais uma vez, as lições de
Zagrebelsky sobre a democracia crítica: 'Para a democracia crítica, nada é
tão insensato como a divinização do povo que se expressa pela máxima vox
populi, vox dei, autêntica forma de idolatria política. Esta grosseira
teologia política democrática corresponde aos conceitos triunfalistas e
acríticos do poder do povo que, como já vimos, não passam de adulações
interesseiras'."

Gilmar Mendes lembrou também que o sistema oferecer mecanismos para impedir
a escolha de maus candidatos e a eleição de maus governantes. "O primeiro e mais
elementar mecanismo de controle é o voto", disse ele. "Outro mecanismo de
controle é a escolha de candidatos no âmbito interno dos próprios partidos
políticos. Cabe às agremiações políticas a eleição de candidatos cuja vida
pregressa os qualifiquem para exercer, com probidade e moralidade, determinada
função pública."

O ministro explicou os motivos pelos quais a Lei da Ficha Limpa provocou
tamanha repercussão popular: "O primeiro é que, a cada dia, todos nós, cidadão
brasileiros, somos afligidos com notícias de atos de absoluta falta de ética, de
quebra de princípios éticos e morais, com casos e mais casos de corrupção na
Administração Pública, fato que afronta o nosso sentimento de viver com justiça
em uma sociedade civilizada", disse.

E prosseguiu: "Em segundo lugar, há a
morosidade do trânsito em julgado de decisões judiciais. Fossem as decisões
rápidas — e isso é uma questão que se coloca — e não tivéssemos tantos casos,
ninguém iria afirmar que esta Constituição não está sendo cumprida, inclusive em
seu fundamento ético".

Para ele, no entanto, não é perpassando o problema que ele será resolvido:
"Conforme bem demonstrou o ministro Celso de Mello em seu brilhante voto, não é,
de forma alguma, restringindo ou constrangendo direitos fundamentais que teremos
um Estado Democrático de Direito, no qual a segurança e a liberdade de todos,
inclusive as do eleitor, serão garantidas".

O ministro concluiu detalhando o seu voto de acordo com os vários
dispositivos em julgamento:
1) pela procedência total da ADI 4.578, para
declarar a inconstitucionalidade da alínea m;
2) pela improcedência da ADC 29, para declarar o
caráter retroativo da LC 135/2010 e determinar sua aplicação apenas em relação
aos fatos ocorridos após a sua vigência, respeitada a anualidade eleitoral
prevista no artigo 16 da Constituição, tal como já afirmado pela Corte no RE
633.703;
3) pela improcedência parcial da ADC 30, para
declarar a inconstitucionalidade da alínea n;
4) pela improcedência parcial da ADC 30, para
declarar a inconstitucionalidade da expressão "ou proferida por órgão judicial
colegiado", contida nas alíneas e e l;
5) pela procedência parcial da ADC 30, para,
aplicando a técnica de decisão da interpretação conforme a Constituição, fixar
que a alínea o é constitucional desde que interpretada no sentido de que somente
as hipóteses de demissão diretamente relacionadas a atos de improbidade
administrativa podem constituir causas de inelegibilidade;
6) pela procedência parcial da ADC 30, para,
aplicando a técnica de decisão da interpretação conforme a Constituição, fixar
que a alínea g é constitucional desde que interpretada no sentido de que
os Chefes do Poder Executivo, ainda quando atuem como ordenadores de despesa,
submetem-se aos termos do inciso I do artigo 71 da Constituição;
7) pela procedência parcial da ADC 30, para,
aplicando a técnica de decisão da interpretação conforme a Constituição,
fixar que as alíneas e e l — retirada a expressão "ou proferida por órgão
judicial colegiado" — são constitucionais desde que sejam interpretadas no
sentido de que seja possível abater, do prazo de inelegibilidade de 8 (oito)
anos posterior ao cumprimento da pena, o período de inelegibilidade já decorrido
entre a condenação não definitiva e o respectivo trânsito em
julgado.

http://www.conjur.com.br/2012-fev-16/leia-voto-ministro-gilmar-mendes-julgamento-ficha-limpa

( Colhido do STF )

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